Nesta etapa, o conceito da Etnografia de Rua das autoras Rocha e Eckert (2001) orientou a incursão. Este conceito propõe, em teoria, realizar a incursão acompanhando o cotidiano com uma reflexão narrativa e, na prática, o etnógrafo precisa ter maneiras de comportamento como a cumplicidade em relação as entrevistas e conversações e a reciprocidade no contato com as pessoas o que demonstra o “desejo de trocas com os nativos” (Rocha e Eckert, p.9, 2001).
Nesse sentido, foi feita a que a reflexão do livro “O interior da história” da autora Waisman (2013), especificamente, do quarto capitulo da segunda parte do livro o qual trata do desenvolvimento da relação entre centro-periferia-região.
Nesta parte do texto, Waisman introduz a relação centro-periferia-região como uma questão econômico-político-cultural e diretamente ligada a arquitetura pois, é a “parte visível de um iceberg que penetra profundamente na realidade histórica” (Waisman, p. 83, 2013).
Procurei esta reflexão devido a autora colocar de maneira clara que o centro (arquitetônico, urbanístico, cultural, econômico) é enfraquecido por haver a criação de novos centros com o processo de desenvolvimento da informação. Assim, a perda de valor do centro para a periferia é a característica que mais se destaca nesta relação.
Nesse sentido, Waisman (2013) coloca que na América Latina, a produção cultural da arquitetura aparece marginal a países centrais, porém com os deslocamentos de informação “ver-se refletidos na produção arquitetônica tanto no campo teórico como no prático” (Waisman, p. 86, 2013).
Ainda assim, é predominante a produção da arquitetura dos países centrais pois a informação de países periféricos sofre com a condição de ser fraca em comparação com os sistemas de domínio político e econômico centrais.
A autora constrói este plano de modo claro e objetivo, do qual reflito que a avenida Braz de Aguiar faça parte deste contexto, como descreve Waisman (2013):
“Tudo isso resultou em que o caráter criativo, positivo e enriquecedor da difusão cultural fique muito frequentemente submerso sob os aspetos negativos de aceitação passiva e superficial, pela qual as novas formas se superpõem as formas culturais existentes, sem entrar em intima conexão com elas, simplesmente substituindo-as interrompendo seus possíveis desenvolvimentos” (Waisman, p. 88, 2013).
Contudo, a autora Waisman luta para substituir a palavra “periferia” por “regional”. Ao atribuir o conceito de região ou regionalismo para as cidades da América Latina, a vantagem e desvantagem de cada região leva em consideração outros sistemas como: demográfico, agrícola ou industrial.
Isso permitiu a arquitetos, críticos, historiadores uma pesquisa mais construtiva, com novos olhares. Para Waisman (2013), o regionalismo é divergência, algo que pode partir do que é para aquilo que pode chegar a ser.
No campo pratico desta incursão, busquei ter o comportamento da “cumplicidade” e da “reciprocidade”. Da mesma forma em que eu estou fazendo pesquisa em uma avenida, outras pessoas estão passando em suas rotinas do cotidiano.
No encontro destes movimentos, há a reciprocidade na observação por contamos com as nossas presenças no mesmo território e, ao tornar a ação humana próxima à descrição, devo pensar na interpretação do momento ou ter cumplicidade para adotar uma expressão.
Incursão na avenida Braz de Aguiar: Percurso realizado na manhã de uma quinta-feira
No início desta incursão, no ultimo quarteirão desta avenida, no sentido do trafego dos carros, há uma variedade de lojas e restaurantes. As lojas, na maioria, buscaram realizar reformas nas fachadas dos edifícios que os tornaram vitrines.
Por exemplo, nesta quadra se percebe a definição dos lotes, aproximadamente de 5 metros por fachada, com uma superfície lisa de vidros com adesivos coloridos e cores neutras tanto na parede externa quanto na interna.
Sobre as cores utilizadas para as fachadas das lojas desta avenida, pode-se fazer uma comparação simples com as cores das lojas da periferia da cidade. É habitual o veículo de comunicação televisiva realçar as cores das ofertas sobre promoções que por sua vez são direcionados ao grande público. Da mesma forma, acontece nas regiões de grande circulação de pessoas, onde os olhos dão destaques a estas publicidades.
Assim, a avenida Braz de Aguiar reflete um lugar que surgiu através do avanço da economia ocupado por nobres famílias que buscaram o conforto da nova área da cidade a qual se tornou um ambiente neutro e pós-moderno.
Avenida Braz de Aguiar no cruzamento com a travessa Benjamin Constant. Fonte do autor. Data: 17/09/15. |
Nas quadras seguintes desta avenida, percebe-se que as pessoas que o habitam sentem que moram em um lugar seguro. Os prédios são modernos, existem bancas de revistas que funcionam como para cada morador. Conforme um morador aparece, o dono da banca abri um sorriso e o pergunta qual será o jornal do dia, o mesmo se repete no ponto de táxi e nas lojas, restaurantes, etc.
Acredito que a cidade se reduza a este ambiente para que mora nele. A comunicação entre os habitantes e os serviços disponíveis, aparentemente, são feitos sempre em um padrão nobre de conduta e de educação. Se fosse para explicar o que ocorre nesta avenida, diria que a arquitetura e o urbanismo orientam as pessoas a se comportarem e a se exercerem como modelos.
Nas duas primeiras quadras de quem caminha do sentido dos carros, a movimentação de pessoas e automóveis segue em direção aos colégios que pela manhã são os maiores pontos de encontro desta avenida. Nada além dos colégios estaduais e particulares concentra mais a atenção.
Há nas entradas um amontoado de brinquedos e bombons de vendedores ambulantes. Crianças e adolescentes se tornam consumidores destes vendedores e aprendem a se divertir com as artimanhas.
Conforme se caminha, a avenida dispõe de sombras e bancos em calçadas largas. A avenida Braz de Aguiar apresenta um cenário que demonstra a época da expansão da cidade de Belém, época em que a borracha tornou a cidade a mais enriquecida da nação. Este Bulevar é um marco desta construção.
Contudo, o tempo e as mudanças ocorridas nele transformaram a arquitetura originalmente adaptadas a terrenos grandes. É de se considerar que esta avenida tem uma parte da paisagem cultural do bairro de Nazaré mais nobre que todas as outras ruas e avenidas, porém, não se tornou um local de arquiteturas antigas que tocam o olhar. É, de maneira inversa, a paisagem cultural considerada “pós-moderna” por alguns autores, aquela que se move pelo conforto dos olhos ou pela economia.
Se entende que esta paisagem é pós-moderna por nela haver as características que Jameson (2002) coloca como sendo o pós-modernismo.
Para o autor, ao discutir uma edificação pós-moderna de Frank Gehry, a aparência do edifício provoca a sensação do “hiperespaço”, ou seja, “o resultado da tensão entre dois termos ou polos, entre dois tipos distintos de estrutura espacial e de experiencia. (Jameson, p. 138, 2002) ”. Esta concepção está presente nas arquiteturas da avenida Braz de Aguiar.
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Conj. de lojas. Avenida Braz de Aguiar entre a travessa Quintino Bocaiúva. Desenho gráfico. Fonte: Luciano Oliveira. |
REFERÊNCIAS
JAMESON, Fredric. Pós-modernismo. A lógica cultural do capitalismo tardio. SP, Ed. Ática. 2ª ed. 2002.
ROCHA, Ana Luiza e ERCKERT, Cornélia. Etnografia de rua. Iluminuras, Porto Alegre, v.4, n.7, 2001.
WAISMAN, Marina. Centro/Periferia/Região. IN O interior da história: historiografia arquitetônica para o uso latino-americanos. SP: Perspectiva, 2013.
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